O diretor Joel Schumacher faleceu na semana em que esse texto foi feito aos 80 anos. E acabou anunciado nas grandes mídias como o diretor dos filmes ruins do Batman (eternamente e batman & robin). São filmes ruins? sim (mas tem todo um contexto por trás que um dia eu explique) mas sua carreira não se resume só a isso. Ele fez outros bons filmes, clássicos oitentistas como 'O primeiro ano do resto de nossas vidas' e 'Garotos Perdidos', '9mm' (com Nick Cage, o ator 8 ou 80 adoramos odiar), o ótimo 'Tempo de matar' e o que pra mim é sua obra-prima, 'um dia de fúria"
Dizem que é um filme que repete pouco nas Tvs a cabo da vida por ser um filme extremamente convidativo. Ou seja, tem o medo de que as pessoas resolvam comprar submetralhadoras e bazucas e saiam explodindo as coisas por aí. Claro que quem viu o filme já se imaginou ameaçando os pobres atendentes de fast food com uma arma pedindo pra fazer um sanduíche igual ao que tem na foto - uma das cenas mais icônicas do filme, mas a mensagem do filme é mais do que isso.
William Foster (Michael Douglas) só queria chegar a tempo da casa da ex-mulher para o aniversário da filha. Desempregado, divorciado, preso no engarramento monstro em um dia de calor infernal em Los Angeles, ele teve o gatilho necessário para deixar o carro no meio do congestionamento, deixar se quebrar e explodir contra tudo e todos. E daí vem a nossa identificação com Foster. todo mundo em algum momento se sentiu acuado, triste, preso pela rotina enlouquecedora do dia-a-dia e teve vontade de explodir em meio a paranoia urbana das grandes cidades. Você já torce pro cara desde o início.
Michael Douglas, em atuação magnífica, consegue representar com maestria todo o ódio acumulado do personagem que se aflorou e não vai mais ficar guardado. Todo ato será extremo e quem passar pelo seu caminho sofrerá as consequências da pior maneira possível. E Douglas consegue expressar sua fúria sem o prazer visto em vilões de blockbusters. Não há sorrisos, ele não se sente mais leve, colocando aquilo tudo 'pra fora'. Só há agonia, cansaço, um olhar intransigente em meio a todas atrocidades que ele vai cometendo ao longo do filme.
'Um dia de fúria' é classificado como drama, mas convenhamos, ele está mais para uma comédia de humor negro. Afinal, você sabe que não é certo rir de atendentes em pânico para fazer o sanduíche perfeito, mas ri mesmo assim,não é? 'D-Tens' - apelido dado ao personagem durante o filme por conta da sua placa de carro que ele abandonou no engarrafamento - deveria ser um cara emocionalmente perturbado, mas a identificação do espectador o faz parecer um anti-herói, daqueles o pessoal adora ver. Só que ao longo do filme ele vai desabando e se entregando cada vez mais a sua insanidade e seu ódio.
Robet Duvall é outro que está sensacional no filme, como o policial em seu último dia de trabalho antes de se aposentar, encarando frustrações até parecidas com D-Tens enquanto rastreia o caminho do 'louco', um contraponto até o clímax do filme, um clássico confronto bandido e mocinho digno de westerns. Muitos dizem que 'pegada' das questões do personagem de Duvall quebra um pouco o ritmo do filme, e é verdade, mas creio que seja mais um espaço para respirar entre as loucuras do protagonista.
'Um dia de fúria' é uma excelente película dos anos 90 que fala de como a estrutura do dia-a-dia da nossa sociedade cria pessoas violentas. E que em muitas vezes basta apenas uma pequena fagulha para alguém considerado um 'cidadão de bem' como o D-Tens explodir e ter o seu próprio dia de fúria, perdido em seu próprio ódio. Se ainda não viu veja e veja que o senhor Schumacher não fez só um super-herói com mamilos eriçados com bat-cartão de crédito.
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